Você está enjoado da música da sua marca? Isso é sinal de que ela começou a funcionar.
Pensa num grande erro. Pois erro maior ainda é matar um asset sonoro no dia em que ele começa a virar patrimônio.
Existe uma cena clássica que se repete em salas de reunião como se fosse no filme Feitiço do Tempo. Alguém olha para a campanha pausada na tela e propõe: "Gente, não aguento mais essa música. Vamos mudar? Que tal dar um 'refresh'?"
É super compreensível. Entre a aprovação, a produção, a mixagem e a veiculação, a equipe de marketing ouviu aquele som 500 vezes. A equipe da agência, que começou antes, já ouviu 1.000 vezes — e já tá doida para fazer algo novo para o portfólio. :)
E às vezes não é nem tédio. É a vontade legítima de mostrar serviço. De fazer mais e melhor. Nessa hora, bate aquela culpa digna de uma Heleninha Roitman: "Putz, se eu mantiver a música antiga, vai parecer que escolhi o caminho mais fácil."
A gente costuma dizer para os nossos clientes: não se preocupem. Não há problema nenhum em escolher o que parece ser o caminho mais fácil. Neste caso específico, aliás, o caminho "fácil" (manter o asset) é, cientificamente, o caminho mais inteligente. E o difícil não é criar o novo; o difícil é ter a disciplina de manter o que funciona.
Tem aquela sabedoria atávica que o nosso mercado às vezes esquece: em time que está ganhando não se mexe. Se o seu "time" (sua trilha, seu jingle, sua voz) está ganhando o jogo da memória lá fora, mexer nele só para "agitar o vestiário" não é gestão. É gol contra, Galvão!
A Matemática da Exposição
O problema é confundir a sua exaustão com a do consumidor. Enquanto você ouviu a trilha 500 vezes numa sala fechada, atentamente, o seu consumidor ouviu, talvez, 4 vezes. E ouviu mal, enquanto lavava louça, dava comida pro pet ou rolava o feed.
Para você, aquilo é música velha. Para o cérebro do seu público, aquilo é um som que está começando a ficar familiar. E em neurociência, familiaridade é porta de entrada pra confiança.
Existe um conceito chamado Fluência Cognitiva. O cérebro humano prefere processar coisas que ele já conhece. Porque é mais fácil e gasta menos energia. Quando você troca a música (ou a voz, ou o conceito) a cada seis meses em nome da "inovação", você obriga o cérebro do seu cliente a começar o trabalho do zero. Você joga fora a consistência que custou uma grana absurda para ser construída.
O Mito do "Cansaço" (Wear-out)
Achou que estamos exagerando? A System1, que é líder global em eficácia criativa, analisou 50.000 comerciais de TV e descobriu que o tal "desgaste" (wear-out) é um mito. O estudo é constantemente revisado, e as conclusões se mantém.
Os Números Não Mentem
► Comerciais bons não perdem força com o tempo - a eficácia emocional deles se mantém estável (e às vezes até aumenta).
► Marcas consistentes têm 2x mais chances de ganhar market share a longo prazo do que aquelas que mudam as coisas o tempo todo.
"Bah, mas isso vale para o Brasil?"
Essa é a pergunta clássica. Gostamos de achar que o brasileiro é um ser diferente, que "cansa rápido" das coisas. A verdade biológica é outra. O cérebro do consumidor brasileiro funciona com a mesmíssima neuroquímica do consumidor inglês ou americano. A Fluência Cognitiva não tem passaporte.
E se você quer uma prova local, verde amarela e indiscutível, a gente tem.
40 Anos de "Vida"
Em 2026, a Jinga completa 45 anos de estrada. E temos um orgulho especial de um jingle nosso que acaba de completar 40 anos, provando o valor que a Ciência encontrou no "não mude". É o tema de fim de ano do Grupo RBS (a música "Vida").
São quatro décadas no ar. O mesmo conceito sonoro. A mesma melodia. A mesma letra. "Vida" passou por oito presidentes da República. Sobreviveu ao Cruzado, ao Cruzeiro, ao Real. Viu a Internet nascer, o MySpace sumir, o TikTok explodir. E continua lá, firme.
Nesses 40 anos, várias vezes algum Diretor de Marketing novo ou uma agência recém-contratada sugeriu: "E se a gente mudasse? Esse jingle já deu, né?". Mas a pesquisa de campo sempre voltava com a mesma resposta: não mude.
Para milhões de pessoas no Sul do Brasil, o som de "Vida!" é o Natal. Tirar a música seria como a Coca-Cola decidir que "cansou" da cor vermelha. A RBS entendeu que "Vida" é mais que uma peça de campanha. É um Asset. É patrimônio.
Tédio que Dá Lucro
Grandes marcas são construídas na base da repetição implacável. A Intel não muda o "Bong". O McDonald's não muda o "Pa-ra-pa-pa-pa". A Netflix não muda o "Tu-dum". A Coca não muda o "Holidays Are Coming".
Eles entendem que o papel do Sound Branding não é entreter a equipe de criação ou aliviar a ansiedade do marketing por novidade. O papel é criar um reflexo condicionado no consumidor: ouvi o som, lembrei da marca. É treinamento.
Se a sua equipe está enjoada da música, parabéns. Esse é o melhor sinal possível de que vocês mantiveram a consistência tempo suficiente para que ela comece a funcionar de verdade lá fora. Que é onde interessa.
Coda
Inovação é vital para produtos. Sem dúvida. Mas para identidade de marca, inovação demais vira esquizofrenia. Tenha a coragem de ser repetitivo. E não se culpe por escolher o caminho "fácil". A gente garante: o seu gerente financeiro vai agradecer.
Porque enquanto você boceja na sala de reunião, o seu consumidor está finalmente começando a assobiar a sua marca na rua. É que ela passou a morar dentro da cabeça dele.
Quer criar um asset para durar 40 anos? Fale com a gente. Estamos aqui pra ouvir você.
"Vida é o hino da RBS."
— Nélson Sirotsky
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